REPETITIVOS
ISS compõe base de cálculo do IRPJ e da CSLL se apurados pelo regime de lucro presumido

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​O Imposto sobre Serviços (ISS) deve compor a base de cálculo do Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) quando apurados pela sistemática do lucro presumido. A definição é da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Tema 1.240 dos recursos repetitivos.

Para consolidar esse entendimento, o colegiado estabeleceu comparações entre a questão debatida no recurso especial representativo da controvérsia (REsp 2.089.298) e a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 69 da repercussão geral, a qual excluiu o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo da contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).

No caso analisado pelo STJ, um laboratório médico de patologia questionou decisões das instâncias ordinárias que validaram a manutenção dos valores do ISS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Invocando a posição do STF, a empresa defendeu que o ISS deveria ser excluído da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, quando apurados na sistemática do lucro presumido.

Ministro Gurgel Faria foi o relator
Foto: Imprensa STJ

Precedente do STF foi estabelecido em contexto específico

Relator do repetitivo, o ministro Gurgel de Faria destacou que não deve prevalecer nesse caso a tese firmada no julgamento do Tema 69 do STF, pois foi adotada em contexto específico, à luz da Constituição. ‘‘A legislação federal, de constitucionalidade presumida, expressamente determina que o valor relativo aos impostos, como o ISS, no caso, integra a receita para fins de tributação de IRPJ e CSLL pelo lucro presumido’’, observou.

O magistrado verificou que o próprio STF deixou claro em seu precedente que a tese não se aplica ‘‘quando se tratar de benefício fiscal oferecido ao contribuinte, como na espécie, em que se pode optar por regime de tributação’’.

Lucro real e lucro presumido: diferenças entre regimes de tributação

Segundo Gurgel de Faria, no regime de tributação pelo lucro real, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL é o lucro contábil, ajustado pelas adições e deduções permitidas em lei. Nessa sistemática, o ISS é um imposto dedutível como despesa necessária à atividade da empresa.

Já na tributação pelo lucro presumido, prosseguiu, multiplica-se um dado percentual – que varia conforme a atividade desenvolvida pelo contribuinte, nos termos dos artigos 15 e 20 da Lei 9.249/1995 – pela receita bruta, a qual representa o ponto de partida nesse regime de tributação. Sobre essa base de cálculo, incidem as alíquotas pertinentes.

‘‘A adoção da receita bruta como eixo da tributação pelo lucro presumido demonstra a intenção do legislador de impedir quaisquer deduções, tais como impostos, custos das mercadorias ou serviços, despesas administrativas ou financeiras, tornando bem mais simplificado o cálculo do IRPJ e da CSLL’’, detalhou o ministro.

Ainda de acordo com Gurgel de Faria, se o contribuinte quiser considerar certos custos ou despesas, deve escolher o regime de apuração pelo lucro real, que abarca essa possibilidade.

‘‘O que não se pode permitir, à luz dos dispositivos de regência, é que promova uma combinação dos dois regimes, a fim de reduzir indevidamente a base de cálculo dos tributos’’, concluiu o relator. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão do REsp 2.089.298

REsp 2089298

REsp 2089356

DEVER DE SOLIDARIEDADE
VT derruba justa causa de trabalhadora que faltava ao serviço para cuidar da filha doente

Após demitir por justa causa trabalhadora que faltou ao serviço para cuidar da filha de um ano que estava doente, o Supermercado e Atacado Saito Ltda., de Nova Mutum (MT), deverá reverter, por determinação da Justiça do Trabalho, a pena aplicada. A empresa alegou que aplicou a penalidade em razão de atrasos e faltas, incluindo uma ausência em julho de 2024.

A trabalhadora argumentou que avisou a empresa sobre a possível ausência, enviando uma mensagem na noite anterior para informar que poderia faltar caso não conseguisse alguém para cuidar da criança.

A empresa atacadista argumentou que a dispensa se deu por desídia, sustentando um histórico de dois atrasos e três faltas sem justificativas, com aplicação de advertências e suspensão antes da justa causa.

Ao avaliar o caso, o juiz Paulo Cesar da Silva, da Vara do Trabalho de Nova Mutum, converteu a demissão por justa causa em dispensa sem justa causa, assegurando à trabalhadora o direito às verbas rescisórias. Ele apontou que a caracterização de desídia requer uma reiteração de atos de desleixo, o que não ocorreu neste caso, em que a empregada se antecipou e comunicou previamente à empresa sobre a possibilidade de faltar para cuidar da filha adoentada, demonstrando que não houve descompromisso com o trabalho.

O magistrado destacou que, desde o início do vínculo empregatício, em 2021, a ex-empregada havia recebido apenas uma advertência e um atraso antes de 2024, ano em que passou a ter os cuidados próprios pós-maternidade. Conforme afirmou, a situação da trabalhadora exige compreensão da realidade vivenciada por ela à época da rescisão do contrato.

A sentença destacou ainda o dever de solidariedade previsto na Constituição que envolve a família, o estado e a sociedade na proteção de crianças e jovens. ‘‘Não se pode desprezar o papel constitucional e moral da trabalhadora de ser responsável legal por sua filha menor, assim como o dever de solidariedade da empresa, que lhe impõe, no mínimo, a obrigação de compreender que seus empregados também são pais, mães e cidadãos’’, salientou o juiz.

A decisão foi fundamentada também no Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que considera a vulnerabilidade enfrentada por mulheres no mercado de trabalho. O juiz atribuiu valor ao relato da trabalhadora, que optou por cuidar da filha em casa sem buscar atendimento médico imediato, não tendo, portanto, um atestado médico para justificar a ausência.

Ele lembrou que essa atitude é comum entre pessoas que cuidam de crianças. ‘‘Isso porque é corriqueiro que crianças pequenas adoeçam sucessivas vezes com gripes, resfriados e enfermidades respiratórias menos graves, já sabendo os pais, em razão disso, lidar com aquela sintomatologia, o que dispensa, pelo menos a priori, dirigir-se até um posto de saúde, onde se costuma enfrentar longa espera e sujeitar-se a outras enfermidades’’, acrescentou.

A decisão reforçou que a trabalhadora retornou ao trabalho na tarde do mesmo dia, assim que conseguiu alguém para ficar com a filha, conforme testemunhado pela representante da empresa. Para o magistrado, isso também demonstrou o comprometimento da trabalhadora, contrariando a alegação de desídia.

Perspectiva de Gênero

Instituído pelo CNJ em 2023, o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero reconhece que critérios de produtividade e assiduidade frequentemente ignoram a carga extra de responsabilidades enfrentadas por mulheres, especialmente aquelas com filhos pequenos. O documento orienta que juízes e magistrados considerem esses fatores a fim de não perpetuar desigualdades.

Ao analisar o caso de Nova Mutum, o magistrado pontuou que os processos envolvendo mulheres, especialmente a maternidade, devem contar com um olhar especial dos julgadores, por se tratar de grupo socialmente vulnerável, historicamente excluído, para quem foi relegada atividades domésticas e cuidado dos filhos, o que ainda traz empecilhos para manutenção no emprego e de progressão na carreira.

Por fim, o magistrado destacou o dever de se cumprir os direitos previstos na Constituição e na legislação, que cada vez mais exige adaptações razoáveis à realidade dos empregados, em respeito aos princípios da dignidade da pessoa humana e da isonomia. ‘‘Não pode a empresa, que tem uma função social constitucional a cumprir, simplesmente entender que a falta da autora decorreu de uma desorganização pessoal da sua vida e que a empresa nada tem a ver com essa suposta desorganização’’, frisou.

Com a reversão da justa causa, o supermercado foi condenado ao pagamento de aviso-prévio e multas como dos 40% do FGTS.  Por se tratar de decisão de primeira instância, cabe recurso ao Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (TRT-23, Mato Grosso). Com informações de Aline Cubas, da Secretaria de Comunicação Social do TRT-23.

Clique aqui para ler a sentença

ATSum 0001089-82.2024.5.23.0121 (Nova Mutum-MT)

ADVOCACIA PREDATÓRIA
TRT-MG afasta suspeição de juiz e aplica multas de mais de R$ 100 mil a advogado que tumultua processos

Divulgação TRT-3

A mera apresentação de reclamação disciplinar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) não retira a isenção juiz para o julgamento de um processo, haja vista que tal circunstância não se insere dentre as hipóteses de suspeição previstas no artigo 801 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) ou no artigo 145 do Código de Processo Civil (CPC)

Nessa linha de entendimento, a Décima Primeira Turma Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais), à unanimidade, rejeitou arguição de suspeição contra o juiz Lucas Furiati Camargo, da 2ª Vara do Trabalho em Betim, manejada pelo advogado Leonardo Jamel Saliba de Souza. O advogado é um dos procuradores de um ex-funcionário em litígio trabalhista contra a Transportes Pesados Minas S. A. (Transpes).

O colegiado penalizou o advogado por comportamento desleal durante a tramitação do processo trabalhando, já que identificou a prática de condutas abusivas na sua atuação, com o fim de obter vantagens indevidas, violando o dever de cooperação estabelecido na lei. Como consequência, aplicou-lhe duas multas que, somadas, alcançam montante superior a R$ 100 mil.

Os integrantes da Décima Primeira Turma determinaram que seja dada ciência imediata da decisão a todas as Varas do Trabalho de Minas Gerais. Após o trânsito em julgado (quando não cabe mais recurso), cópia da decisão será enviada à Secretaria de Uniformização de Jurisprudência, Gerenciamento de Precedentes e Ações Coletivas do TRT-3, para alimentar o banco de dados do CNJ.

Juiz relator Márcio Toledo Gonçalves
Foto: Imprensa/TRT-MG

Situações de conflito

O relator do recurso ordinário trabalhista (ROT) no Regional, juiz do trabalho convocado Márcio Toledo Gonçalves, apurou que o advogado do reclamante, de forma rotineira e contumaz, provoca situações de conflito com inúmeros magistrados. O advogado tentou forçar o juiz a declarar-se suspeito pelo fato de haver apresentado contra ele reclamação junto ao CNJ, elevando o tom de voz de forma provocativa quando este rejeitou requerimento formulado em audiência realizada em 25 de outubro de 2023, criando tumulto, além de agir de forma arrogante, truculenta e beligerante, fato que se repetiu em outras oportunidades.

Na audiência ocorrida em fevereiro de 2024, o mesmo advogado elevou o tom de voz e acusou o juiz de atuar no processo por mero capricho. A procuradora da ré testemunhou que o magistrado sempre agiu de forma imparcial e acusou o advogado da parte contrária de adotar idêntico procedimento contra outros magistrados.

Sem prova das acusações, as reclamações têm sido arquivadas no âmbito do CNJ, reforçando a convicção de que foram infundadas, integrando mera estratégia de manipulação do sistema.

A Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da Terceira Região (Amatra III) vem acompanhando de perto a situação (como amicus curiae = amigo da Corte). A Amatra III acredita que a conduta do advogado se encaixa nas hipóteses de má-fé previstas nas normas processuais, pautando-se pela alteração da verdade dos fatos, utilizando o processo para objetivos ilegais, além de agir de forma temerária, criando incidentes que tumultuam o andamento processual e acarretam prejuízos ao Tribunal, inclusive de ordem financeira.

Por essa razão, o relator, acompanhado pelos demais julgadores, decidiu que o advogado deve ser punido, não apenas por litigância de má-fé, mas também com multa por atentado à dignidade da Justiça. O relator frisou que essas penalidades têm o objetivo de prevenir a repetição desse tipo de comportamento desleal, principalmente quando tal conduta é praticada com a finalidade de afastar magistrados em virtude de entendimentos jurídicos indesejados pelo advogado.

Ferramentas contra o desrespeito à Justiça

O relator citou no voto a jurista Vívian Fernandes ao explicar que, no Brasil, foram adotadas algumas normas para punir quem desrespeita, obstrui ou impede a efetividade da decisão judicial.

No caso em destaque, foram anexadas as atas de audiência de outros processos nos quais o mesmo advogado atuou, mostrando um padrão de comportamento antiético e abusivo.

Na visão do relator, a prática de advocacia predatória e o assédio processual comprometem o funcionamento regular dos órgãos do Judiciário e devem ser prontamente sancionados.

Por essa razão, devem ser impostas penalidades rigorosas ao advogado responsável por essas práticas, prevenindo a repetição desse comportamento desleal. Nesse sentido, pontuou o relator em relação ao caso em análise:

‘‘Retornando ao caso em análise, o litígio aqui instaurado não tem por objeto a resolução da reclamação trabalhista patrocinada pelo advogado excipiente [que pediu a suspeição do juiz], nem cuida da persecução de uma solução viável no interesse do trabalhador. Não se trata, portanto, de atuação do advogado na defesa de pretenso direito do seu cliente, mas refere-se a conflito instaurado em face do magistrado que preside o processo, com o propósito de dificultar a atuação do Poder Judiciário. Se o magistrado tem o dever de estimular uma solução consensual dos conflitos, as partes e seus procuradores têm o dever de agir com boa-fé, lealdade e Cooperação (arts. 5º e 6º do CPC)”.

Suspeição do juiz rejeitada

O magistrado responsável pelo andamento da ação trabalhista negou sua suspeição, afirmando que a existência de reclamação no CNJ não afeta sua imparcialidade. Tanto que o corregedor regional, desembargador Manoel Barbosa da Silva, arquivou a reclamação disciplinar, por inexistir qualquer violação dos deveres funcionais. Segundo o corregedor, no caso, não houve comprovação de que o magistrado tivesse vínculo pessoal com as partes envolvidas.

Assédio processual e advocacia abusiva

O relator também concluiu que o advogado praticou advocacia abusiva ao apresentar um grande número de ações e medidas sem fundamento sólido e com o objetivo de prejudicar o andamento dos processos. Esse comportamento foi considerado uma tentativa de distorcer o sistema de Justiça e atrasar deliberadamente as decisões.

Além disso, as ações do advogado foram classificadas como ‘‘assédio processual’’, uma prática em que o profissional utiliza procedimentos legais de forma abusiva e repetitiva para desestabilizar o andamento do processo e afetar negativamente a outra parte envolvida. Assim se manifestou o relator sobre o tema:

‘‘Em reiteradas condutas no curso do processo, restaram explícitas a má vontade, a resistência, o descompromisso com o interesse das partes e com a busca da solução negociada do conflito. O desprezo e a insensibilidade para com a situação do trabalhador que o contratou, a afronta deliberada ao juiz e à parte contrária –  que também almeja por uma solução rápida e equânime do litígio –, além dos obstáculos opostos à atuação da Justiça, com o comprometimento da credibilidade, da eficiência e da efetividade da atividade jurisdicional, são incompatíveis com o exercício da advocacia.’’

Diante da atuação abusiva por parte do advogado, os julgadores da Décima Primeira Turma do TRT-MG aplicaram-lhe multa por má-fé processual, no valor de duas vezes o teto dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Impuseram, também, uma segunda multa de R$ 100 mil, destinada ao Fundo de Direitos Difusos, para prevenir a repetição da conduta abusiva. Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-3.

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ATOrd 0010972-70.2022.5.03.0027 (Betim-MG)

REPERCUSSÃO GERAL
STF vai decidir se Anvisa pode proibir venda de produtos à base de cannabis em farmácias de manipulação

Reprodução/Governo do Estado de São Paulo

O Supremo Tribunal Federal (STF) irá discutir a validade de uma resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que proíbe as farmácias de manipulação de comercializarem produtos à base de cannabis. Segundo a Anvisa, a comercialização deve ser feita exclusivamente por farmácias sem manipulação ou drogarias, mediante a apresentação de prescrição por profissional médico legalmente habilitado.

A controvérsia é tema do Recursos Extraordinário com Agravo (ARE) 1479210, que teve repercussão geral reconhecida (Tema 1341) no plenário virtual. A data do julgamento ainda será definida, e a tese fixada pelo STF deverá ser seguida em todas as instâncias do Judiciário.

No caso dos autos, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou uma decisão que impedia o Município de São Paulo de aplicar a uma farmácia de manipulação sanções por infração sanitária, como advertência, multa ou até cancelamento do alvará de funcionamento, por vender produtos de cannabis. Segundo o TJSP, a Resolução Colegiada 327/2019 da Anvisa extrapolou as atribuições da agência, pois criou uma distinção não prevista em lei entre farmácias com e sem manipulação.

No recurso, o Município argumenta que não é possível manipular e comercializar produtos de cannabis sem autorização sanitária, por se tratar de substância psicotrópica sujeita a controle especial, para prevenir e detectar desvios. Também sustenta que a manipulação e comercialização dos derivados da cannabis é uma questão de saúde pública e deve ser tratada com rigor técnico por especialistas da área médica.

Em manifestação pelo reconhecimento da repercussão geral, o ministro Alexandre de Moraes observou que essa questão tem sido alvo de decisões dos tribunais estaduais, tanto validando a resolução quanto considerando que a norma extrapolou o poder regulamentar da Anvisa.

Na sua avaliação, a controvérsia tem ampla repercussão e importância para o cenário político, social e jurídico, e o interesse por sua definição não abrange apenas as partes envolvidas. Com informações de Pedro Rocha, da Assessoria de Imprensa do STF.

ARE 1479210

VIOLAÇÃO MARCÁRIA
Adidas e Mercado Livre são condenados a indenizar loja de roupas impedida de vender calças esportivas com duas listras

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

A calça esportiva/jogger com faixas laterais listradas é amplamente utilizada no mercado, tornando-se produto quase genérico na indústria da moda. Assim, a Adidas, mesmo sendo marca de alto renome no segmento, não pode proibir concorrentes de fabricar e vender peças de vestuário que estampem duas listras, pois a insistência nessa conduta significa concorrência desleal.

A conclusão é do desembargador Maurício Pessoa, da 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), ao confirmar sentença que condenou a Adidas do Brasil e o Mercado Livre a se absterem de promover denúncias e de suspender anúncios de calças masculinas estampadas com duas listras brancas verticais nas laterais das pernas, comercializadas pela F. Y. Watanabe Comércio de Roupas (Wooks), em razão de violação de marca registrada.

O relator das apelações também manteve a condenação das duas grandes empresas, rés no processo, ao pagamento de indenizações por dano material, a ser apurado em liquidação de sentença, e moral, arbitrada no valor de R$ 20 mil.

Por meio de simples pesquisa na internet, o julgador verificou que calças com faixas laterais listradas vêm sendo amplamente comercializadas por diversas marcas, inclusive por uma das maiores concorrentes da Adidas, a Nike.

‘‘A despeito de a coapelante Adidas ser titular do registro de marca figurativa contendo três listras, tal fato, por si só, não lhe confere o direito de impedir que concorrentes utilizem uma, duas ou quatro listras laterais em seus produtos. Nesse sentido, a coapelante Adidas não é titular do uso exclusivo de listras; é, sim, titular de marca figurativa que contém 3 listras’’, fulminou, no acórdão, o desembargador-relator, prestigiando a sentença.

O processo

A revenda de produtos do vestuário, sediada em Londrina (PR), acabou denunciada pela Adidas quando passou a anunciar seus itens na plataforma de comércio eletrônico do Mercado Livre. A alegação: ferir a propriedade industrial da marca alemã, em particular as marcas figurativas de titularidade desta, consistentes em três listras, e o conjunto-imagem (trade dress) de seus produtos.

Na origem, o juízo da 2ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem da Comarca de São Paulo reconheceu que a Adidas é marca nominativa de alto renome e que possui registro de marcas figurativas a ela associadas no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), ‘‘consistentes em três listras paralelas, na direção vertical, na direção horizontal, ou ainda na direção diagonal, todas com especificações para artigos de vestuário diversos’’.

Entretanto, lembrou o juiz Eduardo Palma Pellegrinelli, conforme o artigo 124, inciso VI, da Lei da Propriedade Industrial – LPI (Lei 9.279/96), não são registráveis como marca os sinais genéricos – necessários, comuns, vulgares, meramente descritivos – ou aqueles empregados para designar uma característica do produto ou serviço quanto à natureza, nacionalidade, peso, valor, qualidade e época de produção ou de prestação do serviço.

Para o juiz sentenciante, apesar dos itens da autora conter elementos componentes figurativos assemelhados (as listras verticais como adornos laterais em calças), estes estão apresentados de forma suficientemente distintiva. E mais: estes itens apresentam a estampa de apenas duas listras, e não de três, que compõem a marca da Adidas. Assim, existe clara distintividade entre as marcas da multinacional alemã e da autora da ação, podendo, ambas, coexistir no mercado.

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0020850-03.2022.8.26.0100 (São Paulo)

 

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